Obrigado, meu amigo.
Mário Moutinho de Pádua foi o primeiro oficial português a desertar em Angola, em 1961. Narra neste livro a sua experiência a seguir à deserção, a prisão e a tortura que sofreu no Congo, a sua passagem pela Checoslováquia e na Argélia recém-libertada do colonialismo francês.
Mário Moutinho de Pádua foi o primeiro oficial português a desertar em Angola, em 1961. Narra neste livro a sua experiência a seguir à deserção, a prisão e a tortura que sofreu no Congo, a sua passagem pela Checoslováquia e na Argélia recém-libertada do colonialismo francês.
O escritor angolano Pepetela assina o prefácio da obra e refere:
«(...)Finalmente o seu apoio como médico ao PAIGC na Guiné. Mais uma vez, histórias de pessoas com quem se deu, dos militantes que conheceu, dos líderes com quem discutiu. A história de África moderna e combatente vista a partir de um hospital, a política africana analisada a partir de dados pessoais. Muitos grandes combatentes pela liberdade aparecem como pessoas, apenas isso. Nem é preciso dizer que são grandes, pois eles o mostram mesmo sem quererem. A década de sessenta e o livro terminam com afrustrada mas criminosa tentativa da tropa portuguesa em atacar Conacri e decapitar o PAIGC.
Como o seu primeiro, este livro servirá para dar a conhecer muitos aspectos das lutas de África contra o imperialismo. E também a luta e a determinação dos portugueses que se opuseram ao salazarismo e fizeram finalmente o 25 de Abril.
Mas, a meu ver, ele é, acima de tudo, um auto-retrato impressionante de um homem justo. Porque Mário Pádua, antes de ser um combatente corajoso e de ideias firmes, alguém que sempre se bateu pelos seus ideais, é um homem bom, um homem que conhece as fraquezas dos outros e procura ajudá-los, que percebe as tibiezas e as traições, mas não se vinga delas, apenas desejando a justiça para os injustiçados de todas as sociedades, indiferentemente da cor da pele, do sexo, ou classe social. Continua um homem bom, tentando compreender porquê o mundo não é o que merecia ser. Nem o homem.»
Vou transcrever aqui uma situação que me toca particularmente: o que ele diz do soldado Manuel Fragata Francisco, que eu conheci bem, quando foi do meu pelotão, ferido e aprisionado pelo PAIGC em Sinchã Jobel em 16DEZ67, durante a operação Invisível:
«Em matéria de soldados portugueses a nossa coroa de glória foi o Manuel Fragata, em cima da maca durante uma semana, às mãos dos soldados do PAIGC, desde o sítio onde as balas lesaram gravemente o joelho, impedindo a marcha. Não quiseram deixá-lo morrer. Como todos os outros chegou em estado infeccioso complicado. Quando comecei a tratá-lo li nos seus olhos o medo de ser vítima de manipulações cruéis.
Vou transcrever aqui uma situação que me toca particularmente: o que ele diz do soldado Manuel Fragata Francisco, que eu conheci bem, quando foi do meu pelotão, ferido e aprisionado pelo PAIGC em Sinchã Jobel em 16DEZ67, durante a operação Invisível:
«Em matéria de soldados portugueses a nossa coroa de glória foi o Manuel Fragata, em cima da maca durante uma semana, às mãos dos soldados do PAIGC, desde o sítio onde as balas lesaram gravemente o joelho, impedindo a marcha. Não quiseram deixá-lo morrer. Como todos os outros chegou em estado infeccioso complicado. Quando comecei a tratá-lo li nos seus olhos o medo de ser vítima de manipulações cruéis.
Devo reconhecer que a limpeza cirúrgica em zonas do corpo muito sensíveis causava obviamente dores intensas e durante as primeiras sessões, sempre demoradas, muitos dos feridos não conseguiam reprimir os gemidos.
Eu não queria que o Fragata julgasse que eu o magoava voluntariamente. mas não tinha outro meio. Uma anestesia eficaz, repetida, não estava ao nosso alcanse. Ainda por cima a rótula tinha sido parcialmente estilhaçada e tive de extrair alguns pedaços. Enfim com alguma sorte a ferida curou-se e, apoiado em canadianas, o Manuel Fragata recomeçou a andar. Na ala onde ele se encontrava, as relações entre o soldado português e os seus vizinhos de cama foram-se estreitando.
O Luí Cabral manifestava por ele desveIos especiais. Trazia-lhe cigarros, o que eu não podia fazer, porque naturalmente não recebia nem aceitaria salário. O dinheiro da recente herança do meu avô estava na Suíça e eu não sabia como mobilizá-lo. O Manuel Fragata repartia os cigarros e algo muito semelhante à camaradagem se desenvolveu entre aqueles homens ,um português e muitos guineenses que a guerra não conseguiu antagonizar.
O Luí Cabral manifestava por ele desveIos especiais. Trazia-lhe cigarros, o que eu não podia fazer, porque naturalmente não recebia nem aceitaria salário. O dinheiro da recente herança do meu avô estava na Suíça e eu não sabia como mobilizá-lo. O Manuel Fragata repartia os cigarros e algo muito semelhante à camaradagem se desenvolveu entre aqueles homens ,um português e muitos guineenses que a guerra não conseguiu antagonizar.
O PAIGC entregou-o à Cruz Vermelha no Senegal e ele voou para Portugal. Infelizmente já depois do 25 de Abril veio a sucumbir num acidente de moto.
A obediência às directrizes do PAIGC quanto aos soldados inimigos pode ser medida pelo seguinte episódio. Eu estava em casa do Luís Cabral conversando com ele quando entrou um do dirigentes do PAIGC no Norte, o Lai. Muito excitado avisou o Luís:
- Os prisioneiros chegaram à fronteira. É preciso comprar manteiga.
Sabendo que a alimentação no Lar era pobre, monótona, às vezes escassa, essa preocupação punha em evidência que aqueles prisioneiros gozaram de maiores atenções que os próprios combatentes. Improvisou-se um alojamento separado, uma barraca, para eles dormirem alguns dias, sob vigilância e em breve foram entregues à Cruz Vermelha senegalesa. O Lai, de natureza pouco risonha, não procurara impressionar o Luís. Estava sim seguro de cumprir o procedimento padronizado pelo Partido.»
E, de facto, não foi em Ziguinchor mas cá que o Fragata, ribatejano de Alpiarça, morreu num acidente de motorizada, infelizmente.
Caro senhor:
ResponderEliminarGostaria imenso de obter um exemplar deste livro.
Como poderei fazer?
Agradecido pela sua atenção.
C. Serra
casimiro.serra@hotmail.com
Pedi-lo a:
ResponderEliminarEditorial Avante
Avenida Gago Coutinho, nº 121
1700-029 Lisboa
Portugal
Vão enviá-lo à cobrança