Finalmente o pai
do free-jazz subiu ao palco, acompanhado por Dewey Redman (saxofone tenor),
Charlie Haden (contrabaixo) e Ed Blackwell (bateria), e foi, na opinião de
Leonel Santos, «caótico, demolidor, free!», embora os seus sons «ruidosos»
tivessem provocado nova debandada entre o público. Tito
Lívio caracterizaria no jornal República a música de Coleman, considerando-a um
«jazz sem regras, severo, anti-superficial, o destruir das linhas harmónicas, a
arritmia».
Mas
além da música, este concerto faria história quando a dado momento Charlie
Haden se curva para o microfone usado para amplificar o seu contrabaixo e
dedica o tema «Song for Che» aos movimentos de libertação dos negros em Angola
e Moçambique. «Quando o Charlie Haden leu a mensagem, as pessoas nas bancadas
levantaram-se como uma mola e ergueram os punhos em saudação comunista»,
recorda João Braga.
Entretanto, à frente de uma dessas bancadas, pendiam já dois panos com as inscrições «Guiné Livre» e «Abaixo Guerra Colonial», que uma fotografia inédita de Augusto Mayer permite agora revisitar pela primeira vez. No exterior do Pavilhão do Dramático estavam posicionadas duas camionetas com polícia-de-choque e pouco tempo depois o Comandante da PSP de Cascais ameaçava João Braga, ordenando o fim do espectáculo. «Ele disse-me: “Acabem já com isto ou faço entrar esta malta!”, ao que eu respondi: “Faça favor, o palco é todo seu, mas cuidadinho que as cadeiras não estão fixas ao chão…». O espectáculo prosseguiu.
Entretanto, à frente de uma dessas bancadas, pendiam já dois panos com as inscrições «Guiné Livre» e «Abaixo Guerra Colonial», que uma fotografia inédita de Augusto Mayer permite agora revisitar pela primeira vez. No exterior do Pavilhão do Dramático estavam posicionadas duas camionetas com polícia-de-choque e pouco tempo depois o Comandante da PSP de Cascais ameaçava João Braga, ordenando o fim do espectáculo. «Ele disse-me: “Acabem já com isto ou faço entrar esta malta!”, ao que eu respondi: “Faça favor, o palco é todo seu, mas cuidadinho que as cadeiras não estão fixas ao chão…». O espectáculo prosseguiu.
A
imprensa «oficial» ignorou por completo o incidente (a censura não perdoava…),
à excepção do Diário de Lisboa onde, nas entrelinhas de um artigo de José Jorge
Letria (que entrevistara Haden já nas vésperas da sua actuação e o questionara
sobre a possibilidade de o jazz poder ser uma forma de actuação política…), se
podia perceber que algo mais do que jazz se passara no Dramático: «Quem é que
não sentiu um nó na garganta com a violência (negra) do quarteto de Ornette
Coleman? Quem é que não estremeceu ao ver o punho cerrado de Dewey
Redman (…) bem erguido no ar, no final da sua actuação? E éramos todos os
acusados»… Este evento não deixou porém de ser noticiado
nos órgãos clandestinos, como a Rádio Portugal Livre (emitida em Onda Média a
partir da Argélia) e o jornal Portugal Democrático, que informava que «no
Festival de Jazz de Cascais um dos músicos americanos dedicou um número aos
Movimentos de Libertação de Angola e Moçambique. Apesar de falar em inglês, as
suas palavras foram traduzidas pelas pessoas que entenderam e a sala quase veio
abaixo com os aplausos. No final do espectáculo, ao regressar ao seu camarim,
era ali aguardado por agentes da PIDE que o intimaram a deixar imediatamente o
País. Foi forçado a seguir de Cascais para o aeroporto e embarcar no mesmo
dia».
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