Reuni-os, camaradas, para lhes dar conhecimento de um documento revelador, que o nosso serviço se segurança conseguiu apanhar. (...) Estas cinco páginas – continuou Cabral – contêm o programa, digamos mesmo, um programa detalhado de acções subsersivas contra o nosso Partido. Não se fala aqui em nomes de ninguém – Cabral sorriu – excepto no meu e nas datas concretas de realização das sabotagens. São expostos os princípios gerais e os objectivos deste trabalho sabotador. Vou ler-vos as passagens mais interessantes. Este plano – Cabral mostrou-o, agitando as folhas – tem o nome de “Instrução 42/71 – DGS”, e consta de três fases : (...).
Quando os participantes nesta reunião se separaram, na sala ficaram apenas Amílcar Cabral, Aristides Pereira e dois camaradas do serviço da segurança do PAIGC. Chamar-lhes-emos camarada M e camarada N.
“Camarada Amílcar – dirigiu-se o camarada M ao Secretário-Geral – o material que nós reunimos é suficiente para a prisão imediata, tanto do Momo como do Aristides Barbosa.” Cabral fez uma careta dolorosa como se tivesse uma dor de dentes. “Ouçam amigos, já há quase duas semanas que tentam convencer-me da necessidade de prendermos Momo e Barbosa. Lembrem-se que será uma medida extrema e se nos enganarmos isso pode reflectir-se desfavoravelmemte no nosso Partido. Um deles foi membro do Comité Central e ambos passaram mais de sete anos no campo de concentração (de Tarrafal, em Cabo-Verde - nota do autor). Antes de me pedirem para sancionar a prisão, verifiquem cem vezes, considerem mil vezes.” – “Camarada Amílcar! Nós, não somente considerámos e analisámos, como temos dados incontestáveis da ligação destes elementos com a PIDE, quer dizer com a DGS, como agora lhe chamam.” Não podemos considerar as resmunguices de Barbosa e as suas conversinhas com os alunos do internato ou a conduta de Mamadú Turé durante as suas deslocações aos países amigos, como provas incontestáveis da sua culpa. Que há além disso? Nada, e espero que não haja.” – O camarada M olhou para o seu colega e este abanou a cabeça. – “Nós temos outras provas, camarada Amílcar, além das que várias vezes apresentámos. – Aqui estão elas.” – E tirou da algibeira um envelope pequeno. – “Que é isto?” – perguntou Amílcar. – “ O camarada pode, certamente, censurar-nos pelo abuso de poder, mas não tínhamos outra saída. Ontem fizemos uma busca secreta ao quarto onde vive Mamadu Turé e sua mulher. Encontrámos o envelope debaixo duma mala de viagem pertencente ao Momo. Se ler, convencer-se-á que estas notas não são mais do que o resumo da instrução 42/71 – DGS, feito pela mão de Momo. Nós conhecemos bem a sua letra.” – “Não pode ser!” – exclamou Cabral, segurando as pequenas folhas tiradas, certamente, de um bloco notas. – “Esperem, fomos nós próprios que lhe demos como tarefa de descrever o ambiente na PIDE, e a maneira como viviam os presos no campo de concentração do Tarrafal. Talvez isso sejam alguns dados para a preparação do trabalho?” – O camarada M suspirou desoladamente. – “Compreendo que o camarada Amílcar procure sempre no homem as melhores qualidades, mas nós não temos dúvidas, Momo e Aristides Barbosa são cem por cento agentes portugueses. As folhas são a última prova. Não são de um discurso, mas sim de um resumo. Veja bem estes sinais aqui em cima, estes números. Está escrito 42/72, por isso procuramos obter autorização para a prisão de Momo e de Aristides.” – “Bem, - pronunciou devagar – podem agir. Deixem de momento todas as outras tarefas, levem-nos para a “Montanha” e ocupem-se de esclarecer e investigar rapidamente o caso.”(...)
Ignatiev, Oleg , Três Tiros da Pide, Prelo Editora, Lisboa, 1975.
Ignatiev, Oleg , Três Tiros da Pide, Prelo Editora, Lisboa, 1975.
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