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23 de junho de 2011

205-A mais velha aliança do mundo, os "amigos ingleses" e a Guiné

O casamento de D. João I com Filipa de Lencastre, em 1383, marcou o início da mais antiga aliança diplomática entre dois países, actualmente ainda em vigor.
Foram sempre uns "amigos de Peniche" (porquê a carga negativa desta expressão, se até tenho bons amigos em Peniche?...). Já sabemos. Mas vejam como foi na Guiné.


Os ingleses sabiam das dificuldades que os portugueses tinham em ocupar aquele território e dominar os seus povos, e o seu espírito de rapina estava sempre activo. Dominavam já a Serra Leoa[1] desde o século XVII, mas o território logo a seguir[2] (a actual República da Guiné ou Guiné.Conakry), a norte, antes da Guiné Portuguesa, era do interesse dos franceses, também empenhados em ocupar o Senegal[3], mais acima, e até uma parte dos portugueses, a Casamansa. Era, pois, a Guiné dos portugueses que os “amigos” ingleses viam ser mais fácil de apanhar.
Em 10 de Maio de 1792, os capitães da marinha inglesa Philip Beaver e  Dalryrnple desembarcaram em Bolama com 570 pessoas, 275 delas eram colonos para ali se instalarem. E montaram, de facto, a colónia na Ponta Oeste. Mas não estiveram lá muito tempo. No ano seguinte grande parte deles foram dizimados pala malária, de tal modo que os poucos colonos ingleses ainda sobreviventes exigiram o seu repatriamento ao capitão Beaver, tendo este regressado com esses poucos a Inglaterra em 29 de Outubro de 1793.
Mas não desistiram. A pretexto dessa “colonização” de Beaver, voltaram a ocupar Bolama em 1814 e 1827, tendo, neste ano, Sir Neil Campbell, Governador das possessões inglesas da África Ocidental, imposto aos régulos de Bolola e Guinala, no Rio Grande, um tratado de cedência de Guinala e Bolama, bem como as respectivas ilhas adjacentes. Nestas andanças, uma fragata inglesa chegou a atacar perto de Bissau, em 26 de Novembro de 1821, a escuna portuguesa “Conde de Vila Flor”, deixando-a inoperacional no canal do Geba.
Em 11 de Junho de 1828, o 1º tenente Francisco Muacho, Governador de Bissau, obteve do régulo Damião de Canhabaque e do régulo Damião dos beafadas que permitissem apenas aos portugueses o estabelecimento em Bolama. A 20 de Abril de 1830 também o coronel das Milícias, Joaquim António de Matos, consegue desses régulos a construção de um posto militar em Bolama e a cedência da ilha das Galinhas, que é incorporada na coroa a 14 de Janeiro de 1831.
Mas o Governo inglês reclama oficialmente a posse de Bolama em 5 de Março de 1834. Também oficialmente, a 26 de Novembro desse ano, o Governo português recusa essa posse. E a Guiné passou, em 1835, a ser um distrito destacado da Província de Cabo Verde, cujo Governador Geral passou a ter sobre ele todos os poderes civis e militares.
E o Governador da Província queixou-se ao Governo português, em 5 de Novembro de 1836, que os estrangeiros não nos respeitavam, andando navios franceses e ingleses à coca para ver se tomavam Bolama, Bissau e a Casamansa, evidentemente combinados para repartirem entre si “o que nos pertencia”.
E tinha razão. Relativamente a Bolama, os ingleses não se coibiam, de facto. Em 9 de Dezembro de 1838, o tenente Keller desembarcou em Bolama com o brigue inglês “Brisk”, substituiu a bandeira portuguesa pela inglesa e tomou posse da ilha, declarando-a propriedade inglesa. Fez mais: destruiu todas as armas que havia no destacamento português lá existente e a feitoria Nozolini. Zarpou depois levando mais de 200 escravos.
Foi a seguir um período “intenso” (nas circunstâncias da época, claro…) de tentativas por parte dos ingleses de se apossarem do território. Bolama era o local que lhes parecia mais acessível aos seus navios, porque não era defensável, contrariamente a Bissau e Cacheu, onde os portugueses tinham fortificações. A 15 de Abril de 1839 o tenente Keller volta a invadir Bolama e a fazer nova razia. Também W. Blount e os tripulantes do “Plutons” assaltaram e saquearam a Ilha das Galinhas, primeiro, e Bolama, depois, a 8 de Março de 1842. Neste ano ainda, a 22 e 23 de Maio, o tenente C.H.Lapidge, comandante do “Pantaleon”, fundeou em Bolama e declarou a tomada de posse da ilha pela Inglaterra. Passados tempos, o Governador, já Honório Barreto, mandou arrear a bandeira inglesa e substitui-la pela portuguesa. Cinco anos mais tarde, concretamente a 26 de Janeiro de 1847, o comandante do vaso de guerra inglês “Marsay”, obrigou o régulo de Canhabaque, António, a assinar um tratado em que este dizia “não dever protecção e favor a outros navios e comerciantes que não fossem ingleses ou franceses”. Honório Barreto protestou contra isso. Em resposta, talvez, tripulantes ingleses do “Dart” assaltaram e saquearam Bolama a 28 de Novembro desse ano. O Governo e Bissau enviou para Bolama um destacamento de 5 soldados [!!...].
As duas décadas seguintes não foram diferentes. Uma espécie de toca-e-foge. Em Dezembro de 1851, no dia 10, o comandante do navio “Ranger”, Th.Miller, exige a saída dos soldados portugueses que estavam em Bolama. Como não foi atendido, aprisionou os soldados [terão sido os tais 5?...] e levou-os para a Serra Leoa. Novo ataque a Bolama, pelo “Fire-Fly”, comandado por O.Seymor.
Em Janeiro de 1856 Honório Barreto fez uma visita às ilhas de Bolama para se inteirar da situação, nomeadamente da influência dos ingleses na ilha. Esteve no dia 11 em Casaria, na Ilha das Galinhas, em visita ao túmulo da filha do coronel de milícias Joaquim António de Matos. Fora assassinada em Março de 1842 pelos marinheiros do navio inglês “Plutons”. Passou também pelas ilhas de Canhabaque e Orango, tendo recebido dos régulos a garantia de fidelidade a Portugal. Situação volátil, como se verá em anos seguintes (ver aqui). E a 30 de Janeiro Honório Barreto informava o Governador Geral de Cabo Verde que, nas ilhas de Bolama, apenas os régulos de Inoré e Ancataque tinham negociado com o comandante do navio inglês “Tocante” o estabelecimento de feitorias.
Na discussão diplomática de “quem tem direito a”, que já se arrastava desde 5 de Março de 1834, o Conde do Lavradio, embaixador de Portugal em Londres, apresentou a Lord Malmesbury, a 5 de Março de 1859, uma reclamação de posse sobre a ilha de Bolama, apontando que era desde 1819 pertença firmada de Portugal. Mas os ingleses apresentaram-lhe um documento, datado de 29 de Junho de 1792, em que Portugal fazia a cessão da ilha a Inglaterra. Não foi considerado credível esse documento, por falta de bases sérias.
E, a 10 de Maio de 1860, o governo inglês proclama a incorporação de Bolama na Serra Leoa, tendo o Governador desta escrito ao Governador da Guiné, em Dezembro desse ano, reivindicando aquela ilha e o Rio Grande. Sem resposta positiva, claro. Por isso, o navio “Ranger”, a 3 de Junho de 1863, desembarcou uma força em Bolama para a ocupar.
Em 1868, a 4 de Junho, é o próprio governador da Serra Leoa, na altura Sir Arthur Kennedy, que entra pelo Rio Grande de Buba, fazendo razia nas suas margens, especialmente em Ponta Colónia. E, ousadia ou sobranceria?, algumas corvetas inglesas foram a Bissau no dia 6, tendo alguns oficiais desembarcado. Grassava lá, na altura, uma epidemia de febre amarela. O físico-mor Silva Leão aconselhou-os a regressar aos barcos, alertando-os também que não seriam bem recebidos pela população, que sabia que eles tinham prendido em Bolama o Governador da Guiné Joaquim Alberto Marques, quando este lá se encontrava no navio “Carolina”. Em 6 de Julho o Governador Geral de Cabo Verde tomou medidas. Ordenou a organização de uma expedição para expulsar os ingleses das feitorias que tinham instalado no Rio Grande, tendo inclusive arvorado a bandeira de Inglaterra na Ponta Colónia. Também o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Bento da Silva, ordenou nesse mesmo mês ao Conde do Lavradio que apresentasse um protesto ao governo inglês e exigisse a reparação da acção cometida pelo governador da serra Leoa no Rio Grande. O governo britânico fez um inquérito ao caso e ordenou, depois dele findo, a evacuação das forças inglesas.
 Foi lá, no dia 8 de Setembro, a escuna “Bissau” com uma força militar e 2 peças de campanha. Arriaram a bandeira de Inglaterra em Ponta Colónia e substituíram-na pela de Portugal.
As negociações diplomáticas foram mais além. A 26 de Outubro, o Ministro dos Negócios Estrangeiros pediu ao embaixador em Washington, Miguel Martins Antas, que interviesse junto de Mr. Sward para este ver se o Presidente dos Estados Unidos se prestaria a uma arbitragem sobre a posse de Bolama. Veio resposta favorável em 20 de Novembro.
E, em 21 de Abril de 1870, o Presidente dos Estados Unidos, Ulysses Grant, reconhece, em sentença arbitral, os direitos de Portugal à Ilha de Bolama.
Por isso, a 1 de Outubro de 1870, o Governador Geral de Cabo Verde, conselheiro Caetano Alexandre de Almeida e Albuquerque, tomou posse da Ilha de Bolama em nome de Portugal, estando presente Graig Loggie, representando o governo da Grã-Bretanha. O 2º tenente da Armada Guilherme Augusto de Brito Capelo serviu de secretário, escrevendo e assinando o auto de posse.




[1] Foi descoberta em 1460 por Pedro de Sintra, tendo os portugueses instalado-se lá para o comércio de escravos. Foram, porém, os ingleses que acabaram por dominar a região, através da Companhia Comercial Britânica, no século XVII.
[2] Após uma guerra vitoriosa sobre o chefe mandinga Samory Turé, os franceses ocuparam aquela região em 1849, chamando-lhe Protectorado Francês, dependente de um Governador Geral instalado em Dakar.
[3] Foram os portugueses que primeiro chegaram, depois do Cabo Bojador, no Sara Ocidental, àquela parte a que chamaram “África Negra” (Mauritânia, Senegal e Guiné). Estiveram no Senegal, no tráfico de escravos, depois estiveram por lá os holandeses e a seguir os ingleses e os franceses. Mas estas duas potências coloniais decidiram, pelo Tratado de Paris, de 1814, que era a França que ficava com o Senegal.

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