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28 de dezembro de 2010

30-Uma noite, somente, no HMP

Encontrei lá o meu amigo Norberto. Fora meu colega no 2º pelotão do COM de Mafra. Magro, louro, olhos azuis grandes, era um aventureiro, uma máquina em todos os exercícios. Mas foi sempre um bom companheiro, diferente de outros que lá andavam a armar-se em bons e achavam, por isso, ser superiores. Eu sabia que ele, depois da especialidade de atirador, tinha sido mandado para os comandos, e nunca mais soubera dele. Foi um grande abraço. Perguntei-lhe:
- O que é que andas aqui a fazer?
- Ando em tratamento.
- A quê?
- Tenho hemofilia.
Fiquei banzado. Como era possível um tipo hemofílico ser enviado para os comandos!? Mesmo para a guerra. Mas para os comandos ainda por cima... Então não tinham visto isso antes?
- Parece que não te lembras como era aquilo em Mafra. Além da injecção cavalar, que diziam dar para todos os males, não se preocupavam em saber mais nada. Menos, é claro, em ver aqueles que tinham cunhas para ir para os serviços auxiliares.
- É verdade, eu sei bem. Deves lembrar-te que desde o início sabíamos que o nosso curso estava destinado para uma fornada de atiradores. Até pensei que ia gozar com os gajos dos psicotécnicos quando me puseram um papel à frente e me disseram par escolher a especialidade. Pus lá que queria ser atirador mas eles é que se riram de mim. Mas diz lá, então, como é que descobriram isso.
- Eu estava na 3ª Companhia de Comandos na Guiné e…
A conversa derivou, é claro. Disse-lhe que tinha chegado de lá na véspera, ferido por uma mina. Contei-lhe coisas, por onde andara, como tinha sido ferido, operações em que participara, o normal destas conversas. Ele também me contou das dele e acabou por me dizer que, numa operaçãozeca, segundo ele, na zona do Cantanhês, tinha levado um tiro numa perna e que, sorte, o enfermeiro tinha visto que o sangue não estancava, pelo que pediram logo um heli para o levar para Bissau. Tinha sido evacuado para Lisboa há uma semana.
- Vais ficar aqui?, perguntou-me.
- Tem que ser, não é?
- Pelo teu aspecto, pelo teu tipo de ferimentos, até te mexes bem, parece-me que não tem que ser. Tens cá família?
- Tenho os meus pais, moram em Lisboa.
- Então faz como eu. Quando cá cheguei disse-lhes que tinha família na Amadora e eles deixaram-me ir para casa deles. Só venho cá aos tratamentos. E já me disseram que não vão durar muito, porque isto não tem cura, que qualquer dia vou a uma junta médica e que me mandam embora. E até te agradecem, porque precisam de camas para casos mais graves e para gajos que são da província.
Fiquei encantado com a ideia e ele foi comigo aos serviços administrativos. Ficou assente que podia ir para casa dos meus pais e que devia estar no hospital todas as segundas, quartas e sextas, às nove horas, para tratamentos.
Foi o Norberto que me levou, a mim e a mais nada, que era o que eu tinha, no seu citroen 2 cavalos até à porta da casa dos meus pais, na Calçada da Patriarcal. Despediu-se e disse-me:
- Está aqui o meu telefone. Logo à noite, depois de jantar, dá-me um toque para combinarmos ir dar uma volta por aí.
- Claro, vamos lá. Estou com falta disso.

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