(Texto do Daniel de Matos)
Infelizmente, o meu amigo Daniel de Matos, autor desta linhas, faleceu no dia 13 de Novembro de 2011
16 de Maio
Para aqui estamos, os 200 que já cá “moravam” (essencialmente a companhia africana nº 19 e o pelotão de artilharia de 10,5 mm ), mais os acabados de chegar. Se o IN nos poupou às boas-vindas, o certo é que não foi preciso esperarmos vinte e quatro horas para levarmos com a primeira chuva de granadas. Regista-se um morto, – o soldado Martinho Cá, apontador de metralhadora da CCaç 3. Também um dos nossos homens (CCaç 3518) é ferido ligeiramente com o ricochete de um estilhaço, mas nada de grave.
Se no sul nos diziam que quem comandava directamente os guerrilheiros era o temível Nino Vieira, aqui também não fazem a coisa por menos: os renhidos combates que se estão a travar em redor de Guidaje mobilizam largas centenas de homens do PAIGC, que cada vez mais nos apertam o cerco, comandados pelos já conhecidos (de nome, pelo menos) Francisco Mendes e Manuel dos Santos.
Francisco Mendes (também Chico Mendes, ou Chico Té) esteve com Amílcar Cabral e outros dirigentes históricos nos primeiros cursos de formação, em Praga (antiga Checoslováquia). Foi assassinado em 7 de Julho de 1988 , após uma independência pela qual lutou a vida inteira. Mas diz a sabedoria popular, em crioulo, que “dinti mora ku lingu, ma i ta daju i murdil” (os dentes moram com a língua, mas às vezes mordem-na – provérbio guineense)! Chegaria a primeiro-ministro da Guiné-Bissau. Quanto a Manuel dos Santos (Manecas), que além de dirigir guerrilheiros é um dos comissários políticos que coordena quem vive nas “áreas libertadas” e, nesta altura, comanda a Frente Norte, é responsável pelas operações dos mísseis terra/ar em todo o território. Estivera na União Soviética a receber formação específica para operar e ensinar a manejar os Strela. Será ministro da informação logo no primeiro governo da Guiné-Bissau, após a retirada das autoridades portuguesas. Nasceu em Santo Antão, Cabo Verde, em 1943 e será dos raros dirigentes cabo-verdianos do PAIGC que permanecem nos governos de Bissau depois do “14 de Novembro” (golpe de estado de Nino Vieira). Logicamente que na investida contra Guidaje estiveram envolvidos mais quadros do PAIGC, entre eles, Manuel saturnino da Costa, que chegaria a ser secretário-geral do partido e primeiro-ministro da Guiné-Bissau independente, e alguns intermédios, como Lúcio Soares, Joaquim Biagué e Bobo Queita.
Logo a seguir ao primeiro ataque, o furriel Bernardo Monteiro e os alferes Igreja e Cruz foram não sei onde desencantar mais duas camas e colchões, trouxeram-nas para o abrigo e, sobrepondo-as às existentes, montaram-nas em camarata. O quarto do furriel artilheiro ausente, onde há duas ou três semanas só ele residia, transformou-se num dormitório apertado, onde passamos a pernoitar sete almas. Virá também a juntar-se ao grupo o furriel Fernandes, da CCaç 19 (o tal outro transmontano que alguém de Farim indicou ao Machado).
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